segunda-feira, 26 de abril de 2010

HQs e mercado: as decisões editorais



por juniores rodrigues

Os quadrinhos são inegavelmente parte do universo do que se convencionou chamar de cultura pop. É arte? Com certeza! A Nona para o senso comum, a primeira para seus apreciadores mais fervorosos. Dos anos oitenta pra cá o status de arte tem se tornado inquestionável e as premiações em diversas categorias voltadas para "a literatura" têm provado o valor das HQs para contar histórias e mesmo revolucionar o "modo" de contar histórias. Conjugando texto imagético e texto escrito, ela é capaz de nos transportar a universos totalmente diferentes do "nosso" e nos levar a "viver" aventuras inimagináveis. As possibilidades são infinitas e a criatividade dos artistas envolvidos (roteiristas e/ou desenhistas) é o limite. Certo? É o que tentamos responder aqui, embora saibamos que essa não é tarefa das mais simples.

Nosso foco não se dará sobre as HQs tratadas como arte, mas nas HQs como "arte comercial", um produto com características específicas feito, antes de mais nada, para atender a uma demanda de mercado. Pretendo falar brevemente da relação entre a produção de HQs, no seu sentido estritamente artístico, e as necessidades de manutenção de um mercado editorial. Como dito antes, os anos oitenta serviram para conferir respeito às HQs e, desde então, muita coisa de qualidade tem sido feita, sobretudo no quesito dos "quadrinhos adultos", das histórias fechadas. Watchmen, Sandman, Preacher, V de Vingança, Sin City e mesmo personagens como John Constantine têm garantidos os seus lugares como base das HQs "de qualidade". Mas e quanto aos comics, que ocupam uma grande fatia do mercado e que, literalmente, não param nunca? Quais os critérios e as necessidades que essa forma de HQs têm de obedecer para continuar sua atuação sem perder de vista sua coerência e importância para gerações e gerações de leitores?

Nada que abale mais um jovem leitor que ver seu herói predileto erder a vida diante de uma grande e imopssível batalha contra o mal. E nada mais redentor que vê-lo levar a melhor sobre a morte e acompanhar seu retorno triunfante. E isso acontece uma vez. E uma segunda vez. E quando você vê, já perdeu a graça, não convence mais. E quando você vê, você já não é mais aquele garoto/garota que se deixava envolver tanto e se levar pelas aventuras de seus heróis e heroínas. E aí? Simplesmente é a hra de saltar do barco. Assumir a alcunha de velho e se dedicar a coleções fechadas e a seu acervo da época "em que as coisas eram boas de fato"? Talvez... Mas você consegue ser tão sério e sisudo de repente?

É claro que o mercado de HQs se renova bastante em termos de idade de seus leitores, mas nós estamos aqui, velhotes que não conseguem largar o osso. Certamente nos tornamos leitores melhores (muitas vezes graças aos quadrinhos mesmo) e, claro, muito mais exigentes. E então você já leu e releu Sandman e toda a sua coleção de encadernados, mas ainda não resiste em saber o que acontece com seus heróis, quais sagas se desenrolam e qual a última nova novidade que abala seus mundos.

Adentrando um pouco mais na questão desejada, chegamos ao ponto que abala, sobretudo, a nós, leitores antigos, costumeiros: a conjunção entre a produção de um objeto de fruição e as necessidade de avança e manutenção de seu mercado. Como se conciliam a produção artística em torno do mundo dos heróis e a necessidade de renovação de público para esse mundo? Quais as necessidade editoriais que regem, nem sempre por detrás dos panos, as vidas e os universos de nossos "sagrados" companheiros de tantas lutas?

Uma maneira clara de promover alterações no mundo dos heróis é a realização de sagas. Cria-se uma situação substancialmente maior que as habituais, que irá gerar consequências para todos os envolvidos, muitas vezes resultando na dissolução de grupos, inimizades, novas alianças e na famigerada morte de heróis e vilões. A morte, esse parece ser o grande elemento que separa heróis de vilões, a única fronteira que não pode ser cruzada pelos "escolhidos". Então ela vem e nos tira um herói. E isso é doloroso, mais ainda quando se trata de um dos grandes, daqueles que despertam o que há de melhor em seus universos. Capitão América e Superman são bons exemplos disso. E suas mortes e retornos talvez sejam sintomas das necessidades das editoras de manter a bola sempre no alto e de ter outra bola levantada quando a anterior é cortada. Então vem uma nova saga e uma nova "era". E nós, os leitores apaixonados, ficamos com cara de taxo. Sobretudo quando as explicações para os retornos não batem muito bem. Sobretudo quando o que está morto deveria continuar morto. Já vimos esse filme diversas vezes e continuamos a assisti-lo. De novo, talvez a culpa seja só nossa por não trocarmos de canal, mas...

Mataram o Super-homem, mataram Capitão América, mataram o Thor, mataram o Lanterna Verde, mataram (várias vezes) o Flash e, o impensado, embora talvez o mais desejado, "mataram" o Batman (que já havia sido "quebrado"). Estávamos prontos pra isso? Provavelmente sim. E agora todos "'caminham" novamente entre os vivos, mantendo acesa a chama da jutiça. Todos? Bem, o Batman ainda não voltou, mas sabe-se que voltará. Apenas tirou umas "férias" e foi viajar no tempo... Enquanto isso "todos os mortos" do Universo DC se levantaram e, depois de muita luta, voltaram para o descanso eterno. Todos? Claro que não! Alguns heróis e vilões estão aí de novo, prontos pra outra, pra outro embate com a Dona Morte. E qual o porquê disso dentro da infinita narrativa das HQs comerciais? A resposa é quase sempre a mesma: manter a coerência, amarrar pontas soltas e, antes de tudo, dar emoção a novos e "antigos" leitores. Há sempre um projeto terminando e outro iniciando. Já não temos mais um espaço para respirar entre uma "surpresa" e outra, porque... O Arqueiro Verde (que também já morreu) cruzou a linha e toda a "família" de arqueiros está sofrendo as consequências disso, além da própria Liga da Justiça.


Bem, parece que chegamos num ponto sem volta e também sem muita possibilidade de ação. Dificilmente poderemos parar essa onda de mortes e retornos, de ascenções e quedas. Do ponto de vista editorial, são sempre a melhor saída ou opção para reoxigenar o mercado e introduzir novas situações e antigos personagens (e novos formatos) a novos leitores, ainda que muitas (a maioria?) dessas decisões saiam do nada e levem a lugar nenhum, causando irritação e decepção, faltando "culhões" aos editores para manter aquelas mais interessantes (um mundo sem Batman/Bruce Wayne?). De todo modo, é interessante para o nosso crescimento mesmo, como leitores, perceber e dialogar com essas "mudanças" e adaptações pelas quais passam e separar o joio do trigo nessas publicações permanetes. Pois permanentes é o nosso amor à causa heróica e, por mais que sacudam nosso mundo e balancem nossas convicções, resistiremos bravamente junto aos heróis que o tempo nos ensinou a admirar e a acompanhar.

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